«Que dizer desta esta escolha dos centros comerciais, que são de alguma forma espaços apropriados pela classe média…
Porquê o Vasco da Gama? Porquê o Colombo? Porque são espaços de consumo e de grande visibilidade, onde vai muita gente e que são, de certo modo, símbolos. Mas eu até diria que os centros comerciais são transclassistas. Há gente que vai lá para fazer compras, porque eles teoricamente são comerciais, mas, muito mais do que isso, eles hoje são lugares onde as pessoas vão para verem e para serem vistos. Diria que os centros comerciais são os novos lugares de cruzamento das pessoas.
Seria abusivo presumir-se que haveria na escolha dos lugares alguma intenção de entrar e "contaminar" os tais espaços da classe média?
Eu acho que há uma intenção de os adolescentes se visibilizarem aos olhos das classes que eles suspeitam ou que imaginam que estão nestes espaços que são as classes médias. Acho que é só isso. [...]»
São as novas praças e avenidas, espaços públicos mas de direito privado, higienizado de todo o debate e opinião crítica e onde a única linguagem tolerada é a linguagem do marketing. Fecha-se a porta, acaba-se a contestação. Assim o pensaram e delinearam as corporações, no percurso pela hegemonia das marcas na sociedade, ao juntarem a oferta consumista num mesmo espaço, fechado e atractivo, porque protegido dos humores do clima, numa oferta aparentemente diversificada e desferindo um golpe nos pequenos negócios e negócios independentes. Genial.
O reverso é que o público alvo das corporações e das marcas são os jovens, os mesmíssimos jovens que são primeiros a sentir na pele a exclusão e a desigualdade, o fosso cada vez maior entre os cada vez menos, mais ricos, e os cada vez mais, mais pobres, vítimas do novo capitalismo financeiro, o desemprego e as dificuldades dos pais pelos baixos salários e pela precariedade, os jovens sem saída profissional, os jovens "no future" em casa dos pais até à velhice, os jovens com cursos superiores e trabalhos precários, ou em partime, mal remunerados, aos balcões dos centros comerciais... das marcas e das corporações.
É muito mais do que isso. É pior, ou melhor do que isso, dependendo do ponto de vista. Mesmo sem o saberem, mesmo que inconscientemente e sem o admitirem, os jovens direccionam o seu protesto e a sua revolta mesmo direitinho ao núcleo, ao "osso" que é onde dói mais, o centro comercial das marcas e das corporações que necessitam dos jovens para sobreviver. E isto é uma coisa maravilhosa, porque não "prevista" na sociedade higiénica, clean e de gente guapa. idealizada pelas corporações e pelas marcas.
"The Future's So Bright, I Gotta Wear Shades", Timbuk3.
[Imagem de autor desconhecido]