"Podem ainda não estar a ver as coisas à superficie, mas por baixo já está tudo a arder" - Y. B. Mangunwijaya, escritor indonésio, 16 de Julho de 1998.
O que eu menos quero pensar é que o primeiro-ministro do Governo do meu país, seja ele quem for, seja ele de que partido político for, possa ser um corrupto. Não quero pensar nem quero ficar com a mais pequena dúvida sobre isso. E também acho que o primeiro-ministro do meu país, seja ele quem for, não quer que nós pensemos isso sobre a sua pessoa, nem que reste no nosso imaginário a mais pequena dúvida sobre a sua idoneidade. Por uma razão que a mim me parece muito simples: é do seu interesse.
É por isso que esta estória das «pressões sobre os magistrados» me parece muito mal contada. Vamos mas é resolver isto rapidamente e bem, para toda a gente poder ir a votos com a cabeça limpa, a saber ao que vai, e a decidir a cruz em função da acção governativa nos últimos 4 anos.
Suponhamos que aquando da descolonização e do regresso dos milhares de colonos portugueses das “províncias ultramarinas” – léxico Estado Novo –, ao invés de os termos integrado na sociedade da "metrópole" – léxico Estado Novo again –, os tínhamos enfiado nuns campos construídos para o efeito, ali para os lados do Alentejo ou de Trás-os-Montes, com o estatuto de refugiados retornados, e por lá ficassem, e por lá tivessem filhos a quem era concedido reconhecido o estatuto de refugiados retornados, e depois netos a quem era também concedido reconhecido o estatuto de refugiados retornados, e por aí fora.
Vem esta conversa a propósito da Orquestra Juvenil Palestiniana “Cordas de Liberdade”, composta por jovens com idades compreendidas entre os 11 e os 18 anos, e que, apesar de serem nascidos na Cisjordânia, continuam a ter o estatuto de refugiados que tinham os seus pais e os seus avós, quando há 50 anos fugiram ou foram expulsos das suas casas na guerra que se seguiu à criação do Estado de Israel. Cinquenta anos!
Nascer, viver e morrer com o estatuto de estrangeiro no seio do seu próprio povo.
Uma “reserva” humana conveniente, ali à mão, para servir de joguete e de arma de arremesso. Há pelo menos meio século que “a culpa é de Israel”.
Os putos iam de excursão de Finalistas. Ser Finalista é ter entre 17 e 19 anos, não mais. Levavam uns charros para fumar na viagem e nos 10 dias de soltura dos pais. Leva charros para fumar na excursão de Finalistas quem fuma charros, seja ou não finalista, vá ou não de excursão. E os charros são vendidos dentro da escola ou à porta da escola. Depois das viaturas policiais “Escola Segura” terem ido embora. O que acontece sempre logo depois dos pais terem deixado os filhos na escola. Estão lá nas horas de entrada e nas horas de saída para cumprir a sua função: serem vistos pelos pais.
Ficamos todos muito mais descansados. Há menos bêbados na estrada e menos duas pistolas no distrito de Setúbal. Os nossos filhos foram sem droga para Lloret de Mar.
E quando lá chegarem vão andar por portas e travessas para a comprar. A quem não conhecem. Sujeitando-se a sei lá o quê e relacionando-se sei lá com quem. Mas isso já é problema da Guardia Civil. E vai sair no relatório espanhol do ano de 2009.
Pequenos e simples passos como conhecer “o outro”, para a verdade oficial, não é conveniente que sejam dados. Interessa alimentar o Ódio e a Raiva. Desde pequenino. Porque “de pequenino é que se torce o pepino”, na sabedoria popular, ou “é que se torce o destino”, na letra de Sérgio Godinho. E além disso “só tem medo do Diabo quem já ouviu falar dele”.
A Orquestra Juvenil Palestiniana, “Cordas de Liberdade”, foi dissolvida pelas autoridades do Campo de Refugiados de Jenin - a norte da Cisjordânia -, por ter cometido o “crime” de tocar para um grupo de sobreviventes do Holocausto.
“Nós temos que proteger as nossas crianças e a nossa comunidade”, palavras do líder do Campo.
Havia em finais dos anos 60 princípios dos 70 do século passado (!), mais ou menos a época em que decorre a acção do Conta-me Como Foi, uma sala de cinema a 5 tostões a sessão dupla aos domingos à tarde. Era num anexo à igreja de S. Sebastião, ali na parte detrás do cemitério da Nossa Senhora da Piedade, mais ou menos entre o Bairro das Fontaínhas e o bairro de S. Domingos, em Setúbal. O projeccionista era o padre, que nos dispensava de prédicas e homilias para passar logo à acção, e nós sentados em bancos corridos de madeira, tão velhos como a igreja e duros que nem cornos.
Íamos em bandos ver filmes do Sandokan, e do Robin dos Bosques com o Errol Flynn mais o seu bigode, e do Jóni Beiços de Mula na pele de Tarzan, e também umas cobóiadas onde morriam índios a dar com um pau, e filmes para rir com o Totó, e também deste senhor que faz agora 70 anos. Parabéns!
De uma forma ou de outra o desconsiderado foi o suspeito do costume: o público, o cidadão anónimo, o que paga um serviço do seu bolso.
Mas nem tudo é mau, nem tudo é “lamentável”, recorrendo ao léxico usado por José Sócrates em situações mais ou menos recentes em que foi alvo de vaias e apupos. Talvez perceba agora que as pessoas não gostam de ser desconsideradas e desrespeitadas, e percebe-o logo numa situação em que não pode fazer uso do discurso do costume do “esses manifestantes eu conheço-os bem. São militantes e simpatizantes do PCP e os seus métodos são sobejamente conhecidos.”
Afirmações no mínimo curiosas da boca do Presidente do país, exemplo máximo da miscigenação de raças, cultura e até credos religiosos. Para memória futura.
Do que eu gosto especialmente nestes eventos organizados pelo PSD são as fragrâncias; os aromas no ar. Não é que nos eventos do género, organizados pelos outros partidos políticos, cheire mal ou cheire pior. Simplesmente não cheira.
O esmero colocado na produção, não do evento, mas dos participantes themselves. O cuidado, a aparência, e o cuidado com a aparência. Não há subtracções nem multiplicações. Na casta superior do PSD todos têm o exacto conhecimento do cânone, mesmo aqueles que pelos gestos, pelo vocabulário, pelas expressões faciais, pelos pequenos sinais, são facilmente identificáveis como pertencendo às castas inferiores.
O PPD “partido mais português de Portugal” PSD é um mito; é uma fábula-conto-de-fadas, uma mentira conveniente. O célebre “circuito da carne assada” é uma cedência oportunista para português ver. E isto ajuda a perceber muita coisa.
Ignorando que Helena Amaral, professora no Agrupamento da Escola Quinta de Marrocos, em Benfica, ganhou os seus minutos de fama da praxe, qual o critério que leva a que uma não-notícia seja transformada numa notícia? Apresentar o projecto Magalhães como um insucesso? Um caso (mesmo uma dezena ou uma centena) entre milhares parece-me manifestamente poucochinho…
Ser o Magalhães uma das imagens de marca deste Governo? Além de poucochinho, parece-me reles.
Devia dar que pensar (muito) isso sim, que alguma(s) família(s) tenham de recorrer à venda de um computador que custa no máximo uns míseros €50 como forma de equilibrar o orçamento familiar.