O deserto, ou a estupidez tem limites
Legenda:
Caravana do PS em acção de propaganda - Setúbal, últimas legislativas.
Confesso que pensei mais que duas vezes antes de escrever sobre isto, tal não é o absurdo do tema. Ainda tenho as minhas dúvidas se isto merece comentário…
«Fazer um aeroporto na margem Sul seria um projecto megalómano e faraónico, porque, além das questões ambientais, não há gente, não há hospitais, não há escolas, não há hotéis, não há comércio, pelo que seria preciso levar para lá milhões de pessoas»
Mário Lino - ministro das Obras Públicas.
Vamos lá a ver se percebi bem a coisa. Um dos argumentos contra a Portela é que se situa no meio de tudo. No meio das escolas, no meio dos hotéis, no meio do comércio, no meio de milhões de pessoas. E que qualquer dia há uma catástrofe. Este argumento contra a continuação da Portela, marca pontos a favor da construção de um novo aeroporto, noutro lugar qualquer, Ota ou Margem Sul, não é isso que está agora em discussão – apesar de eu me inclinar pela Margem Sul – desde que por ali à volta não haja nada, ou quase nada. E que não se torne a cair nos mesmos erros do passado – especulação imobiliária e urbanizar a eito. O absurdo das declarações do ministro, para não lhe chamar outra coisa, reside no facto de a Ota ser muito mais deserto que a Margem Sul, logo a haver uma aeroporto, e, segundo o raciocínio de Mário Lino, seria no Rio Frio ou no Poceirão.
Também podemos entrar por outro lado. Um aeroporto não é só um local onde aterram e descolam aviões. Quando se constrói um aeroporto, constrói-se um pólo aglutinador de empresas e serviços; de desenvolvimento duma região. Logo teria de ser no “deserto” da Margem Sul, se o discurso de Mário Lino fosse coerente.
Mas a Margem Sul não é nenhum deserto. Temos por exemplo a Auto Europa; a ainda Cintura Industrial de Setúbal; os Parques Industriais do Seixal e Palmela; o Porto de Sines; o Porto de Setúbal; o Fórum Almada; o Fórum Montijo e o Outlet de Alcochete; temos cinemas e teatros – Almada é a capital europeia do teatro; e, pasme-se (!), temos Universidades e Politécnicos. Hospitais, vamos tendo enquanto o ministro Correia de Campos andar entretido a acabar com eles noutras zonas do país…
Sobre estas declarações seria deveras interessante ouvir o que os autarcas e presidentes de Câmara eleitos pelo PS têm a dizer. E também os que já foram presidentes, eleitos pelo partido de Mário Lino. Esta trás água no bico, porque estou a lembrar-me concretamente de Mata Cáceres que governou Setúbal durante 16 anos. Setúbal à época não era um deserto, mas era um sítio aprazível e com um bom índice de qualidade de vida, e foi em nome desse mesmo desenvolvimento que o ministro das Obras Públicas diz não haver na Margem Sul, que Mata Cáceres escaqueirou a cidade e a transformou num caos.
Interessante de ouvir também, era a opinião de Belmiro de Azevedo. Com milhões de euros investidos para transformar a Península de Tróia num must do turismo. Pespegam-lhe com o aeroporto lá para a Ota e acabam com a Portela. Segundo o douto ministro «não há hospitais, não há escolas, não há hotéis, não há comércio». E há as questões ambientais, que só existem aqui, e que não existem, por exemplo, na Costa Vicentina, ao redor do Alqueva, ou no que ainda resta do Algarve. Tudo PIN’s (Projectos de Interesse Nacional), respeitadores do ambiente e tudo!
Há quem veja nestas caLINOadas (já tínhamos as PINHOadas do ministro da Economia) um sinal do desespero argumentativo em defesa do indefensável - a Ota. Pode ser que sim, mas eu além disso, encontro também aqui outra variável. Desde a revolução de Abril, e salvo raras excepções, o pessoal cá deste lado, da Margem Sul, vota sempre comunista. E estas coisas pesam e pagam-se. E Mário Lino é um ex-comunista.
(As saudades que eu tenho dos tempos da primária, em que o meu pai me levava de camelo para a escola “do Sousa”, ao lado do que agora é o “Santiago do choco frito”, e parava para o animal beber água num oásis que havia nas Fontaínhas, mesmo em frente aos ferrys para Tróia. Tempos que não voltam mais…)